a arte de ser mais ou menos

Quase 32 anos me sentindo mais ou menos. Ah, é isso… uma amiga mais ou menos, uma namorada mais ou menos, uma aluna mais ou menos, uma filha mais ou menos, uma profissional mais ou menos, uma irmã mais ou menos, uma chefe, mais ou menos, um ser humano mais ou menos que faz coisas mais ou menos.  E o que é doido: quase orgulhosa por ser mais ou menos, porque em um mundo de tanta tanta gente menos, não preciso ser mais! Mais ou menos resolve, passa na média.

Nunca fui a mais feia da escola, mas muuuito longe de ser a mais bonita, era a mais ou menos. Sempre entreguei meus trabalhos, mas sempre com aquela sensação de que entreguei mais ou menos. Não sou super engraçada, mas tenho lá meu senso de humor… mais ou menos engraçada. Na hora de me vestir, não sou cafona, mas não sou estilosa, sou mais ou menos. Nem alta ou baixa eu sou… nem magra ou gorda, nem meu olho é claro ou escuro. É tudo mais ou menos mesmo. Tenho um gosto mais ou menos bom, sou mais ou menos legal, sou mais ou menos uma boa companhia. Sou mais ou menos organizada, tirei notas mais ou menos na escola e na faculdade, entrego mais ou menos bons projetos. Longe de ser medíocre, mas nada perto de ser brilhante.

ilustração: Liza Rusalskaya

Vivi confortavelmente até aqui sendo essa coisa nada demais, mas me preocupando com a hora que vou me encher o saco e querer desesperadamente ser incrível em algo. Sabe? Uma sensação de que eu fui sensacional em algum momento. Esse sentimento de ser mediana hoje não é um problema, é um lugar confortável e que me permite observar… e mudar. Quando uma pessoa mais ou menos muda, ninguém se choca, é ótimo! E eu não preciso explicar muita coisa pra ninguém. Eu gosto desse lugar, mesmo! Por enquanto eu gosto. Nele eu não surpreendo muita gente, verdade, mas eu também não decepciono. É aqui no meio termo que eu vou vendo onde queria ser melhor e vou tentando. Tentando ver o copo meio cheio aqui: quem é nota 7, tem várias chances de melhorar. Quem é nota 10 só pode piorar.

Claro, muitas vezes na minha vida encontrei pessoas na vida pessoal ou profissional que me disseram que fui incrível. Discordei convicta! Essas pessoas estavam erradas, eu só tinha sido mais ou menos. De novo. Muita dificuldade em receber um elogio que me tirasse da média. A vida toda. Passei também por momentos em que disseram que fui ruim em algo que eu me achava mais ou menos? Sim também. Discordei também. Poxa, ruim não… eu fui só mais ou menos.

Eu não tô reclamando, nem pedindo elogios. Eu reconheço várias das minhas qualidades e dos meus defeitos, tá tudo bem quanto a isso. Não sou uma sabotadora de mim mesma, eu só tô aqui transitando livremente entre o patético e o impressionante e sendo o que eu quiser. Quase sempre longe dos holofotes porque as pessoas gostam mesmo é de falar da vida de gente escrota e de gente foda, ninguém perde tempo comentando vida de gente mais ou menos. A liberdade do mais ou menos é maravilhosa e eu aproveito ao máximo! Vou, volto, insisto, desisto, mudo, ouso, fico, questiono, melhoro, pioro e vou caminhando pra onde eu quero ir, se é que eu sei pra onde quero ir.

Um dia eu devo acordar com a sensação de ter sido ou feito algo incrível, mas enquanto isso… sigo no conforto de ser incrivelmente mais ou menos.

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